05 novembro 2018

"Estado precisa investir em presídios, não pode deixar de ser punitivista" - José Robalinho Cavalcanti


José Robalinho Cavalcanti é presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, entidade representativa da carreira que completa 45 anos em 2018.




ConJur — Mas diante de tamanha população carcerária e das condições dos estabelecimentos prisionais, não estaríamos alimentando o próprio crime?

José Robalinho —
 Isso é inumano. Aquelas pessoas são pessoas. Podem ter cometido um crime, mas são pessoas com todos os direitos, mas tratadas como nós nos recusamos a tratar animais. E aí eu boto a culpa para todos os lados. O governo federal foi de uma irresponsabilidade aguda, inclusive o governo passado. A equipe que o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo colocou era tão idealista, tão excessivamente garantista que segurava o dinheiro para construir presídio porque dizia que para ser construído tinha que atender tais e tais circunstâncias. Aí o Estado, que é quem construía, dizia o seguinte: 'Olha, eu não posso construir desse jeito que o senhor está falando porque isso demandaria muito mais mão de obra, professores etc. que eu não tenho'. Então ficava um impasse e não construíam. Deixavam as pessoas feito animais. Mas não foram apenas eles os culpados. Os estados também.
No país você tem uma parte da população que tem a ideia profundamente equivocada de que gastar dinheiro com penitenciária é gastar dinheiro com vagabundos. Por que não fazer escolas? Porque aquele vagabundo é um ser humano que depois de cumprir pena vai voltar escolado em crime, sem contar que ele tem os seus direitos humanos. Então a população cobra que não se gaste dinheiro em presídio. É preciso construir presídios. O sistema penitenciário tem um déficit de vagas brutal, de investimento de décadas. Não se resolverá de uma hora para a outra, ainda que amanhã assuma um presidente que priorize de fato isso ou que os governadores se conscientizem. Presídio não é uma obra que se faça de um dia para outro. Vamos levar anos para melhorar. E temos que melhorar.
Hoje os presídios se tornaram território do crime no qual as quadrilhas mais organizadas e mais perigosas organizam e comandam o crime aqui fora. O Estado perdeu o controle dos presídios. Então nós precisamos de investimento, precisamos de melhores leis, leis mais duras com esses criminosos que comandam lá dentro. A possibilidade de sistemas penitenciários menores, retomar o controle do Estado e fazer um sistema penitenciário que preste. Isso não significa que a gente prenda demais. Há um grande erro. Eu sou membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Eu já ouvi muito lá do pessoal acadêmico esse comentário. Tem muita força esse comentário despunitivista: 'o Estado tem que deixar de ser punitivista'. O Estado não pode deixar de ser punitivista com tanto crime violento. A solução não é tirar bandido violento da cadeia ou diminuir pena. Favorecer um sujeito que se comporta bem para que ele chegue mais rápido ao final de pena é justificável em qualquer lugar do mundo e deve ser mantido. Mas daí, em um sexto de pena, o sujeito já entrar para o semiaberto, e o semiaberto no Brasil, como não tem investimento no sistema penitenciário, a Justiça definiu como 'não tem dinheiro então manda ele para casa'. A população não entende e não tem que entender mesmo. Porque dá uma sensação imensa de impunidade.

*Conjur












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